quarta-feira, 27 de novembro de 2002

CRÍTICA: CRIMES EM PRIMEIRO GRAU / Crime de guerra é ver este filme

A situação continua difícil no front. O que estreou em Joinville no último feriado quase me levou a uma internação por depressão. Tem o Bruce Willis ganhando a Segunda Guerra sozinho em "A Guerra de Hart"; tem um bando de desconhecidos em "Não é Mais um Besteirol Americano", que também poderia chamar-se, sem prejuízo do conteúdo, "É Feio Mentir". Então fui ver um com o Morgan Freeman, que pelo menos é um bom ator. Ainda não guardei o título. Acho que era "Crimes em Primeiro Grau". Logo depois da exibição, o maridão resumiu: "Esta produção se destaca. Posso dizer que é um dos piores filmes de tribunal que já vi". E eu, incrédula: "É um filme de tribunal?!".

Em partes. "O Crime Não Compensa" começa com tensão. A Ashley Judd e seu esposo aproveitam o período fértil para engravidar, e tudo que pensei foi: Cruz Credo! Salvem-nos de mais uma Ashley. Os dois pombinhos compõem um casal feliz, que joga sinuca, janta fora e faz sexo para efeitos de reprodução, como manda o papa. Só que, de repente, o sujeito, um ex-militar, é preso e acusado da morte de nove salvadorenhos em 88. Não me dispus a descobrir se isso existiu ou não. O importante mesmo é que houve um atentado terrorista a um barzinho em El Salvador, e lá morreram três estudantes ianques. Ó, gente, isso não se faz. Americano é o bem sagrado da humanidade. Suponho que a trama toda seja ficção, porque não consigo imaginar um filho do Tio Sam ser julgado por matar cucarachas.

A Ashley faz uma advogada de sucesso, mas nem ela tem grande experiência em tribunais militares ou crimes de guerra. É claro que ela defenderá o marido, e para isso convoca o Morgan, que é mais especializado. Como o Morgan é alcoólatra e está a 483 dias sem beber, a gente sabe que, assim que ele pegar o caso, sucumbirá à velha tentação. Por um tempinho, me iludi achando que é o personagem que não agüenta o baque e tem que beber. Mas não. Acho que é o ator. A atuação do Morgan é tão convincente que logo suspeitei que ele percebeu a enrascada em que se meteu e encheu a cara.

Também, tadinho. Torço para que ele tenha completado sua trilogia com a Ashley, composta por "Beijos que Matam", "Na Teia da Aranha", e mais este urubu. Trabalhar com a Ashley deve ser um prazer, pois ela é maravilhosa – enuncia cada palavra e vem sempre boquiaberta, no melhor estilo "Vou mostrar meus dentes pro público pensar que sei interpretar". Quando ela diz "Your Honor!" (Meritíssimo), pronunciando cada sílaba, você nota todo seu alcance dramático. Ela é magra de ruim, e muda de penteado várias vezes durante "Primeiro Grau Incompleto". Sabe como o cinema exibe pôr do sol pra mostrar que se passou um dia? Aqui, fazem isso com o cabelo da Ashley. E com olho preto. Meu, nossa heroína apanha! Aliás, esta é a única vantagem de se assistir aos veículos da Ashley: vê-la apanhar. Eu mesma tava pegando senha pra entrar na fila do tabefe. Se bem que ela bate também. O marido dela, provavelmente vítima de personalidade múltipla, lhe sussurra: "Tá tudo bem, meu anjo. Vamos superar isso". E a moça taca-lhe um copo na cabeça. Vou usar esta técnica de tolerância zero nas minhas próximas discussões conjugais.

Mas quem viu "Último Degrau" pode supor que estou tentando me vingar do filme só porque lá tem uma prostituta chamada Lola. Olha, não creio que esta provocação seja pessoal. Lola é o nome padrão das quengas nas produções hollywoodianas. O filminho segue todas as convenções do Manual do Roteiro Sem Inspiração, por que pularia essa?

Bom, o que se salva deste drama são os bastidores. O Morgan fez o sacrifício extremo de vir ao Brasil só pra divulgar o filmeco, e foi recebido por FHC. Tudo bem que nosso presidente não tava fazendo nada mesmo, mas isso mostra como somos uma republiqueta. Quando o, sei lá, Murilo Benício for expor o próximo filme dele nos EUA, vamos exigir que o Bush lhe abra as portas da Casa Branca. Pode chamar de retaliação, olho por olho. Opa, esqueci que filmes brasileiros nem chegam aos States...

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