sábado, 29 de novembro de 2003

CRÍTICA: O TODO PODEROSO / Jim Carrey, Deus pros íntimos

Jim Carrey é Deus! Mas isso você já sabia, né? Bom, eu e o maridão pegamos a última sessão de “Todo Poderoso”, comédia em que Jim faz O Próprio, e a gente esperava que, sendo tarde, o cinema estivesse vazio. Ledo engano. Tava lotado. Nem tinha lugar pra gente sentar junto. Mas aí Deus deu o primeiro sinal de sua existência divina. Um rapaz simpático se ofereceu pra trocar de cadeira pra que ficássemos juntinhos. E o resto da sessão foi um paraíso. Adorei “Todo Poderoso” até chegar ao seu terço final, mas já já eu chego lá.

A distribuidora tá investindo alto no filme, então é provável que você já tenha visto o trailer na TV e saiba do que se trata. Mas, se não souber, taí: o Jim faz um repórter desiludido com a vida, tão revoltado que diz que Deus é um menino sádico com uma lupa brincando com uma formiga, e ele é a formiga. Deus aparece na forma do Morgan Freeman, que é realmente celestial, e fala pra ele fazer melhor. Pronto – Jim será o Pai Nosso por uns dias na sua cidade. Claro que esse resumo pode ser ainda mais abreviado: “Todo Poderoso” tem o Jim Carrey. Pra bom entendedor isso basta. Se você é fã dele, veja o filme. Se não é... Pessoalmente, sou fã número 1 desde “Truman Show”. Pra mim, ele é um gênio, o tipo de ator físico que não se via desde o Jerry Lewis. Mas, quando eu indicava “Truman” pros amigos, vários diziam odiar o Jim. Ele tem quase tantos detratores quanto admiradores. Ou seja, eu e o Jim somos parecidíssimos, tirando o salário.

Mas lá estava eu me divertindo pra valer com “Todo Poderoso”. Chorei de rir sem parar durante dois terços do filme. Há seqüências hilárias como a dos orgasmos, do Jim separando a sopa de tomate como se fosse o Mar Vermelho, e d’ele se vingando do âncora (feito por Steve Carrell, ator de TV que consegue a façanha de roubar cenas do Jim numa comédia). E me identifiquei com o cachorro do Jim. Meu cãozinho também nunca aprendeu a fazer xixi no lugar certo. Ele faz em qualquer objeto inanimado que estiver à mão. Em cima do maridão, por exemplo, ele fez uma única vez. É verdade: o maridão tava deitado e o cãozinho foi lá na maior cara de pau e levantou a patinha. Ainda bem que meu cão é tão pequeno que seu apelido é minúsculo molusco.

Mas então, fazia tempo que eu não ria tanto no cinema. O público comparecia a todas as piadas. E aí o filme morre no seu terceiro ato. Sei que vou dizer uma coisa que parece óbvia, mas quando “TP” fica sério, ele perde a graça. Por que não uma comédia rasgada do começo ao fim? Algum pecado nisso? Antes mesmo do Morgan fazer seu segundo discurso – algo tenebroso como “milagre é uma menina dizer não às drogas e sim à educação” –, o filme já tinha recebido o atestado de óbito. Pô, guardem as mensagens edificantes pros discursos do Bush! Vou arriscar uma explicação pra derrapada final de “TP”. Deve ser a mão pesada do Tom Shadyac, o diretor mais odiado de 9 entre 10 críticos desde que cometeu “Patch Adams - O Amor é Contagioso” e “O Mistério da Libélula”. No lado A de seu currículo há dois filmes com o Jim, “Ace Ventura” e “O Mentiroso”. Gostei deste último, mas só das partes engraçadas, sabe, antes do Jim aprender que mentir é feio (mas sou tão fã do Jim que gostei até de “O Pentelho”). Na meia hora estúpida de “TP”, o Jim olha pra gente e grita pra Jennifer Aniston: “Me ame! Me ame!”. Até achei um pouco constrangedor que um cara com esse salário faça uma súplica de amor dessas ao público, mas ego é ego. Jim podia passar sem essa.

O maridão, que não achou “TP” grande coisa, reclamou que é triste que, quando uma pessoa se transforma em Deus, ela não resolve os problemas do mundo. E eu: “Isso, vamos ter conversas filosóficas sobre um filme desses! Acontece sempre de pessoas virarem Deus! É uma comédia, seu repolho!”, eu respondi respeitosamente. Se bem que, no cinema, Deus é um tema constante. Lembra de “Deus é Brasileiro”? Pois é, com todo o respeito ao Antonio Fagundes, na atual ordem mundial, Deus ser americano convence muito mais.

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