terça-feira, 28 de novembro de 2006

CRÍTICA: INSTINTO SELVAGEM 2 / Nem cruzando os dedos

Fui ver “Instinto Selvagem 2” cruzando os dedos, mas com boa vontade. Afinal, o trailer não era tão hediondo, e, principalmente, sou bem fã do primeiro “Instinto”, o de 92. Tudo bem, o filme de 14 anos atrás é trash, é machista, homofóbico, ridículo em várias partes, mas foi também a última vez que o Paul Verhoeven mostrou que tinha algum talento. Mesmo que metade dos espectadores não tenha compreendido o final confuso (o picador de gelo pertencia à Sharon Stone), era uma historinha bem contada, um thriller sexy, cheio de toquinhos inteligentes, como a decisão de não mostrar o que o Michael Douglas considerou “a transa do século”, porque nenhuma cena, claro, iria corresponder às expectativas. E a cruzada de pernas da Sharon virou ícone, sem dúvida. Até hoje lembro do pôster genial de uma comédia qualquer que parodiava “Instinto”. Mostrava as pernas cruzadas de uma mulher e a chamada, no colo, “Opening Soon”. Não dá pra traduzir o trocadilho, que não se refere apenas a abrir as pernas, mas também à estréia em breve. No entanto, apesar de todo o estardalhaço, ninguém, tirando talvez o empresário da Sharon, estava ansioso por uma seqüência. Mas eis que ela veio sem ninguém pedir. E andam espalhando que a parte três vem aí, poupe-me, ó Senhor.

Não é que “Instinto 2” seja ruim. Não, ruim não. É péssimo. Nesta ocasião a escritora interpretada pela Sharon mais ou menos repete o esquema do primeiro (sedução, manipulação, assassinatos múltiplos), mas o coitado da vez deixa de ser um detetive e passa a ser um psiquiatra. Já começa com a Sharon tendo um orgasmo, digamos, explosivo, usando um dedo de um cara que mais parece um cadáver. Devo admitir que nunca tive um orgasmo assim, dirigindo um carro luxuoso a 160 km por hora e culminando num mergulho no Tâmisa. Aliás, não dá pra entender por que tantos paspalhos insistem em se envolver com uma mulher que é a maior chave de cadeia, ou chave de cemitério, ou chave de manicômio, no mínimo. Perguntei pro maridão se ele cairia por ela, se ela por acaso o escolhesse pra protagonizar um de seus romances e quisesse ter aulas de xadrez. A resposta dele: “Pagando, fazemos qualquer negócio”.

Mas como todo mundo vai ver “Instinto 2” só pra observar a Sharon, vou falar sobre ela. Sempre gostei da Sharon. Ela esteve ótima tanto como canastrona em “O Vingador do Futuro” quanto em papéis sérios como “Cassino”. Mas é muito triste que uma boa atriz beirando os 50 só possa ser isca de bilheteria se continuar aparentando 30. E como a natureza não perdoa, dá-lhe botox e cirurgia plástica. Pelo que sei, o objetivo desses troços é suavizar as linhas de expressão. Mas repare no nome: linhas de expressão. Se já é grotesco prum mortal ficar inexpressivo, com o rosto todo esticado, prum ator é pior ainda. A Sharon atualmente não consegue fazer mais que levantar um cantinho da boca ou uma sobrancelha (nunca os dois ao mesmo tempo). Ela acaba parecendo uma boneca de cera, tadinha. Daí que a Charlotte Rampling (de “O Porteiro da Noite”) tá mais bonita que ela. Enquanto eu perdoei a Charlotte até quando ela exclama “Oh, que lacaniano!”, a Sharon já é candidata imbatível à Framboesa de Ouro do ano que vem, que premia os piores.

Pensando bem, “Instinto 2” não merece o dois no título. A personagem da Sharon parece não ter passado, os outros personagens são todos novos, e agora a cidade é Londres, não São Francisco. A única coisa igual é a Sharon. Quer dizer... Hum, pensando melhor ainda, o único motivo pra ver este desastre tedioso (eu dormi) é pra conferir como uma pessoa auto-confiante se comporta. Cruza as pernas sem usar calcinha, fuma onde não pode, por aí vai. Você acompanhou um estudo divulgado a algumas semanas sobre se ser bonito ajuda no trabalho? Dizem que ajuda, porque os belos são mais auto-confiantes. Então o segredo não é ser bonito, mas ser auto-confiante. Portanto, mesmo que a gente não consiga ser uma Sharon Stone de 14 anos atrás, só tem que passar auto-confiança. Ou seja: pra que botox, pelamordedeus?

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