sábado, 30 de abril de 2011

A ENCENAÇÃO QUE MANTÉM A ORDEM

Espetáculo matrimonial transmitido para o mundo inteiro

Ontem falei um tiquinho sobre o casamento real, mas tenho mais pra falar. Só que parece que o assunto já morreu (ainda bem!). Bom, pro meu curso de Crítica da Mídia, estamos lendo o ótimo livro da Marilena Chauí, Simulacro e Poder: Uma Análise da Mídia (2006) e lá ela cita Umberto Eco. Em Viagem na Irrealidade Cotidiana (1984), Eco distingue a paleotevê (o evento acontece independentemente de sua transmissão) da neotevê (o evento é preparado para ser transmitido). Ele compara as transmissões do casamento de Grace Kelly com o príncipe Rainier de Mônaco, em 1956, com o de Charles e Diana, em julho de 1981. Ambos tinham rituais parecidos, mas o da televisão antiga não foi pensado para ser transmitido. As câmeras tiveram de ir atrás, tentando se posicionar para encontrar os melhores ângulos. No segundo, de acordo com Eco, “estava absolutamente claro que tudo aquilo que acontecia fora ensaiado para a televisão”. Desde as cores das roupas dos noivos e convidados (tom pastel para criar um ar de primavera televisiva) e o vestido de noiva feito para ser visto de cima (onde ficariam as câmeras), até a cor do cocô dos cavalos (que tomaram pílulas especiais durante uma semana para que “seu esterco ficasse com uma cor telegênica”). Londres virou um estúdio. Para Chauí, “o espetáculo não se referia ao acontecimento e sim à encenação do acontecimento, ao seu simulacro” (17).
Seria um insulto à inteligência de qualquer um perguntar com qual casamento o de William e Kate, ontem, mais se pareceu, se com o de 56 ou o de 81.Tô com a daminha no meio da foto e não abro.

Isso me fez lembrar o que diz Guy Debord em A Sociedade do Espetáculo (1997). Para ele, o espetáculo é uma ferramenta de pacificação e despolitização, uma guerra permanente do ópio. Apesar do espetáculo se apresentar como instrumento de unificação, o que ele realmente faz é separar. Isso fica claro no casamento real. Por um lado, um evento desses parece que une a Inglaterra e, até certo ponto, o mundo (afinal, foi visto por 2 bilhões de pessoas de todos os cantos). Por outro, no entanto, ele deixa claras as diferenças de classe. Temos o povão e a monarquia, os à margem versus os escohidos por deus. Num artigo de Michael Bristol que li já faz algum tempo, ele descreve eventos de pompa oficial e procissões reais, em que a hierarquia é exposta de forma muito pedagógica, didática até. Uma procissão mostra às pessoas as crenças da classe dominante. O casamento real faz exatamente a mesma coisa. É um selo de “É assim que vocês devem se comportar”. Quer dizer, o que é tradição senão um atestado de que a ordem (“natural”) das coisas deve ser mantida?O bolo real teve oito andares. Nenhum deles de chocolate.

Voltando a Chauí, no livro ela menciona o grande Truman Show, o Show da Vida (1998; pra mim um dos nove melhores filmes da década de 90), e eu fiquei matutando se cabe alguma comparação entre Truman e William. Desde seu nascimento, William aparece na mídia. A diferença é que ele sabe que tem câmeras apontadas pra ele, e Truman não. Todas as pessoas com quem Truman se relaciona são atores. Toda a cidade é um cenário. Sua vida é um show (onde pouco acontece) 24 horas por dia. Mas mais interessante do que pensa ou como age Truman/William é o comportamento de seu público. Truman reconforta os espectadores, que dormem com a TV ligada enquanto ele está dormindo (William lembra seus súditos que a monarquia vive e que contos de fadas podem se concretizar, desde que a plebeia venha de família milionária que já frequentava o castelo real antes do casamento).Sou a única que acha essa imagem assustadora?

O público de Truman sabe que tudo é uma farsa, mas se comporta como se aquelas vidas fossem reais.
Chauí diz que o público encara a decisão real de Truman de deixar seu show como se fosse ficção: “Truman, ou o protagonista, distingue realidade e ficção, verdade e simulacro, mas o público tornou-se irremediavelmente incapaz dessas distinções” (19). Eu acho que a monarquia sabe bastante bem o que é real e o que é ficção. E sabe melhor ainda que o público adora fingir que não sabe.
O casamento como espetáculo mais uma vez alcançou seus objetivos, que é promover o consumo e manter o status quo. Concordo com a Laurinha: amor mais sincero é o de Charles e Camilla.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

CASAMENTO REAL, OU SÍNDROME DE SÚDITO

Este semestre passei a saber muito mais sobre a história do Reino Unido do que gostaria, pois estou lecionando a disciplina de Inglês 7, que é justamente sobre cultura britânica. Se eu voltar a lecioná-la (e eu quero, pois é uma disciplina legal de se dar, não tem livro, a gente é quem bola tudo), vou diminuir bastante a parte de História. Até agora, metade do semestre, salvo algumas exceções, vimos uma imensa galeria de reis e rainhas, o que é um martírio pra mim, que abomino a monarquia (não consigo pensar em um só rei, rainha, príncipe ou princesa, de qualquer país ou época, por quem eu nutra a menor admiração), e os rituais e as tradições de forma geral. Já que eu e meus alunos aguentamos até aqui, vamos ter de falar um pouco sobre o casamento do século, este de William e Kate. Ainda não engoli nem o casamento do século passado, aquele de Charles e Diana, que custou 30 milhões de libras (a bagatela de 90 milhões de reais?).
A rainha vai pagar parte deste casamento (não se sabe qual será o custo total, já que eles não divulgam). Os pais de Kate, que têm uma fortuna de R$ 78 milhões, pagarão outra parcela mais modesta, na casa dos R$ 260 mil. Mas os contribuintes serão responsáveis pela fatura da segurança e transporte. E eles não se importam em pagar, nem estando na pior crise econômica desde a Segunda Guerra Mundial. Apenas 18% dos britânicos é contra a monarquia. Fica mais fácil entender essa louvação se pensarmos que, em toda sua história, eles só tiveram uma república durante onze aninhos. Aliás, adoro essa anedota real. Vou contar: após várias guerras civis internas, em 1649 Charles I foi condenado pelo Parlamento e executado por traição. Foi a primeira e única vez que um rei foi morto não por seus sucessores ao trono (Shakespeare explica), mas por quem deveriam ser seus súditos. Oliver Cromwell então governou a Grã Bretanha, bastante tiranicamente também, até 1658. Este foi o curto período da República (de 1649 a 1660), que deu tão errado que o filho exilado de Charles I, previsivelmente chamado de Charles II, foi recebido com pompa de volta a Londres. E adivinha qual foi o primeiro ato do novo rei? Canonizar seu pai, lógico. Até hoje o Santo Carlos Mártir da Igreja da Inglaterra é celebrado pela tradição anglicana. (O segundo ato do novo rei foi mandar executar todos os juízes que votaram a favor da morte de seu pai, porque vingança pouca é bobagem, mas deixa quieto).
O reino de Charles II, que marca a restauração da monarquia, foi caracterizado pela peste negra e por um incêndio que quase destruíram Londres, e pelo hedonismo (o que pode ser visto em O Libertino, péssimo filme de 2004 com o Johnny Depp –- quem faz o rei é o John Malkovich). Embora Charles II não tenha tido herdeiros com sua esposa, Catarina de Bragança (parece familiar? Ela foi filha de João IV, rei de Portugal), ele deixou doze filhos ilegítimos (quer dizer, esses só contando os que ele reconheceu). Pra provar que não dou ponto sem nó, sabe quem é descendente de um desses filhos bastardos? A princesa Diana.
Amanhã falarei mais sobre o espetáculo que será o casamento (que não pretendo ver) do filho de Diana com a plebeia. Só queria dizer que considero muito mais interessante que todas essas tradições que existam gatos oficiais. Pelo menos eles servem pra alguma coisa: caçam ratos. E custam pouco, só umas cem libras por ano. Outra opinião: compreendo que os britânicos deem tanta importância pra um evento tão sem importância. Mas e o resto do mundo, por que esse fascínio? O que faz com que dois bilhões de pessoas queiram acompanhar uma cerimônia carérrima de uma instituição simbólica e inútil como a monarquia?
Eu tenho uma pista. Lembro de uma colega da faculdade de Pedagogia me dizendo como ela admirava a monarquia britânica, e que o sucesso dessa monarquia era o principal motivo pelo qual aquele país estava tão melhor que o nosso. Acho que minha colega adorava a monarquia porque não sabia absolutamente nada sobre ela e porque tinha crescido ouvindo contos de fada e príncipes encantados. O que ela mais queria na vida era que os Bragança voltassem a ser nossos reis, praí sim o Brasil tomar jeito.
Tem uma galerinha doida pra ser súdita de alguém, né? Prefiro ser cidadã, obrigada.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

GUEST POST: SEJA FEMINISTA, ORAS! (DIVISÃO DO TRABALHO DOMÉSTICO JÁ)

Como todo mundo sabe, a profissão de empregada doméstica não é muito frequente nos países ricos. Lá é caro ter empregada, porque o salário de uma não é assim tão distante do que ganha um médico, por exemplo. Nos EUA e em partes da Europa, algumas famílias de classe média até conseguem ter empregada, mas contratando imigrantes ilegais. Ou seja, estamos falando de uma profissão que só se mantém através da exploração de uma classe social por outra. No Brasil, um dos países mais desiguais do mundo, 17% das mulheres trabalham como empregada doméstica. É uma herança escravagista nossa que não deveria orgulhar ninguém, muito menos medir status social. Não há dúvida alguma que, quando e se houver distribuição de renda, a profissão de empregada estará fadada a senão desaparecer, pelo menos não ser a mais comum entre as brasileiras. Em outras palavras, se a sociedade melhorar (e imagino que tod@s queiramos que a sociedade melhore), o seu privilégio de poder explorar o trabalho de outro ser humano estará com os dias contados.
A meu ver, a questão das empregadas domésticas é o calcanhar de Aquiles do feminismo nos países em desenvolvimento. Muitas feministas, como eu, são de classe média. Mas têm empregada e defendem com unhas e dentes o seu privilégio (que mal veem como privilégio) de ter empregada. É uma das ocasiões em que a defesa de classe (média) fala mais alto que a defesa das mulheres. Toda vez que publiquei algum texto cutucando essa ferida constatei que ser de classe média é mais importante, pra tanta gente, do que as lutas das minorias. E lógico que as pessoas que aparecem aqui pra dizer como pagam e tratam bem sua empregada doméstica devem desconhecer a estatística de que apenas 26% d@s empregador@s cumprem as leis trabalhistas. A julgar pelo maravilhoso mundo da classe média, empregadas domésticas têm um emprego de sonho. Quem não seria empregada se pudesse?
Como ontem foi o Dia Nacional das Trabalhadoras Domésticas, pedi pra Niara, jornalista que tem o ótimo blog Pimenta com Limão e que já nos brindou com um comovente guest post sobre seu filho, que escrevesse sobre o assunto. Apesar de Niara ter condições de contratar uma empregada, ela crê que seu feminismo e sua sede por justiça social devem ficar acima do seu privilégio de classe. Eu acredito nisso também, e tento viver de acordo com minhas convicções. Se sou contra a exploração dos pobres pelas classes abastadas, de negros por brancos, de mulheres por homens, também tenho que ser contra a exploração de mulheres pobres por mulheres de classe média. Ah, e isso não isenta, de forma alguma, os maridos de classe média. Dizer que contratar empregada é um assunto de mulheres é uma das formas de desvalorizar o trabalho doméstico e de perpetuar a divisão do trabalho. Não adianta fingir que não é com vocês, não. A Niara explica isso muito bem a seguir.

Antes de começar a falar sobre o trabalho doméstico vou levantar algumas premissas que norteiam meu pensamento e, portanto, meu raciocínio para poder analisar o trabalho doméstico como é realizado hoje.
O surgimento do patriarcado e da opressão de gênero se deu no momento em que os grupos sociais deixaram de ser nômades e o trabalho passou a ser dividido sexualmente. Até então a humanidade se organizava em grupos matricêntricos (não matriarcais). As mulheres precisavam ficar mais próximas de sua prole e coube-lhes o trabalho no âmbito doméstico, privado, a coleta de frutas e a criação de pequenos animais. Aos homens, em função da força física, coube a caça, o trabalho pesado da agricultura que logo se desenvolveria e a criação de animais maiores. Mas o fator decisivo na opressão de gênero ocorreu quando o homem descobriu seu papel na reprodução humana, até então desconhecido.
Está claro que o fato da humanidade deixar de ser nômade, a divisão sexual do trabalho e a descoberta do homem de sua função na procriação foram fundamentais para o surgimento da propriedade privada juntamente com o controle sexual da mulher. Afinal os homens, agora machos provedores, precisavam ter certeza de sua descendência para garantir a herança de seus bens.
Conhecer a nossa história nos ajuda a entender os meandros de nossa opressão. Mas claro que a humanidade evoluiu, se modernizou, vieram os meios de produção, o acúmulo do capital ― que advém do trabalho, é sempre bom lembrar ― e as mulheres sempre ali, no seu mundinho privado, exceto pelas chamadas pioneiras e revolucionárias que nunca se importaram com rótulos ou com quão árdua fosse a luta desde que não ficassem numa situação de submissão ad eternum.
Mas assim como o surgimento da opressão de classe se confunde com a opressão de gênero e se sustenta nela, a luta das mulheres por sua libertação também. Se por um lado a violência sexista é ampla e democrática, no restante da vida a opressão de gênero é infinitamente mais leve para as mulheres burguesas. Enquanto as operárias trabalhavam na fábrica e ao chegar em casa precisavam dar conta do trabalho doméstico ― já que a divisão sexual permanece ―, as mulheres burguesas contam com o auxílio de outras mulheres que iam fazer o "seu" trabalho.
Estou colocando dessa forma para explicitar que a origem do problema está na divisão sexual do trabalho, uma vez que nós mulheres conquistamos o direito ao trabalho no espaço público mas não conseguimos dividir o trabalho no espaço doméstico.
É nítido onde quero chegar. Ter uma empregada doméstica ― posto ocupado em sua quase totalidade por mulheres e em sua ampla maioria por mulheres negras ― é coisa da burguesia. E essa nossa classe média, que não se cansa de assimilar valores burgueses e imitar seus costumes, no primeiro degrau de ascensão social, na primeira oportunidade contrata logo uma empregada doméstica. É status social.
Cômodo, não? Para se livrar do "dever" do trabalho doméstico que não é dividido igualitariamente entre os habitantes de uma casa, a mulher que ascende socialmente trata logo de explorar o trabalho de outra mulher em clara desvantagem social para limpar a sujeira produzida por ela e pelos habitantes de sua casa. Nada mais grotesco e senso comum. Sem falar na opressão racial diretamente embutida nesta relação e na sua origem escravagista.
Costumo dizer "Eu limpo minha sujeira" para salientar que precisamos é discutir a divisão sexual do trabalho. Eu, enquanto feminista, preciso aprender a negociar a divisão do trabalho doméstico com minha família e os habitantes da minha casa. Porque explorar o trabalho de uma mulher em clara desvantagem social e racial não é solução. Assim como defender meus privilégios classemedianos pequeno burgueses não me isenta da cumplicidade e participação ativa na opressão dessas mulheres.
É tão tosco manter alguém para limpar a sujeira produzida por outros que daqui a pouco organizarei protestos com o mote "LIBERTE SUA EMPREGADA DOMÉSTICA!". Grotesco por grotesco, fico com a luta por justiça.
Valorizar o trabalho doméstico, dignificá-lo, passa justamente por assumi-lo. Para a legião de burguesas, pequeno burguesas e classemedianas que reagirão a esse texto com uma vontade súbita de se tornarem faxineiras, digo: Se limpar a sujeira da TUA CASA é tão digno assim, FAÇA VOCÊ MESMA! Está pesado, difícil, não tem tempo? A modernidade e a tua falta de habilidade em negociar o trabalho doméstico com tua família não pode servir de desculpa para a exploração de outra pessoa, principalmente de outra mulher. Seja feminista, oras! Lute pela tua libertação e pela libertação daquelas que ainda não adquiriram consciência de gênero.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

SÉRIES AMERICANAS E A MINHA PAIXÃO

No início de março, uma pessoa que eu adoro na blogosfera (minha correspondente oficial na França!) me enviou um email:

Oi Lolinha, aqui é a Amanda, do Porte Dorée (que aliás vc abandonou pra sempre, né? Hunf!). Eu sigo fiel ao seu, leio todo dia, apesar de comentar menos. Então, estou te escrevendo pra ver se você ajuda a resolver meu problema. Às vezes eu chego em casa cansada, querendo esvaziar minha mente do cotidiano e tal, então procuro um filminho ou uma série pra ver. O problema, Lolinha, é que muitas vezes (pra não dizer quase sempre) tenho péssimas surpresas e o que era pra ser um filminho descontraído acaba me deixando mais irritada do que eu ja estava. É tanto machismo em Hollywood que não acaba. Então eu queria sugerir que você fizesse um post onde suas lindas leitoras pudessem indicar filmes, séries e livros (por que não?) que não acabem com nosso dia. Não estou falando de filmes engajados, feministas militantes, nada disso não. Quero apenas filmes onde o único desejo da mulher não seja arranjar um macho pra chamar de seu. Poderia ser filminhos bobos ou inteligentes, comédias ou terror, qualquer coisa vale. Pensei em fazer no meu próprio blog, mas com certeza no seu seria muito mais eficiente. Bom, eu tenho uma comédia romântica pra indicar: Wimbledon, O Jogo do Amor. E também tenho uma série: United States of Tara. Um beijão!

Eu sou assim, eficaz –- pra usar a palavra que a Amanda escolheu. Portanto, não só levei quase dois meses pra fazer o post, como não vou sugerir absolutamente nada, simplesmente porque não conheço séries feministas. Ok, vamos achar bom se ao menos sugerirmos coisas não machistas. Deixo esse trabalho ardiloso pra vocês, querid@s leitor@s, que certamente assistem mais séries que eu, que nem tenho TV a cabo.
Mas fiquei com vontade de escrever um tiquinho sobre o pouco que vejo de séries. Claro que, do jeito que sou prolixa, isso será tema pra uns dez posts.
Outro dia um leitor, o Ian, recomendou que eu visse The Killing. Vocês já viram? É baseada numa série de TV dinamarquesa. Aceitei a recomendação do Ian e vi os três primeiros episódios (até agora são apenas quatro). Gostei mais ou menos. O início lembra muito Silêncio dos Inocentes, e a protagonista é uma detetive que investiga o assassinato de uma adolescente. Tem muita gente comparando o troço com Twin Peaks, mas não vejo semelhanças. Precisaria entrar um anão dançando pra eu sequer pensar no David Lynch. Pra ser franca, não tenho opinião formada sobre a série ainda. Tenho de ver um pouco mais pra saber se estão me enrolando (afinal, é tudo sobre um assassinato). Até agora não achei nada grande coisa, nem as interpretações, nem o clima, nem os diálogos. Se bem que quando apareceu a mãe da menina morta eu pensei: já vi essa bonitona em algum lugar. Ela (Michelle Forbes) é a personagem responsável pela pior subtrama de True Blood e a mulher do Gabriel Byrne em In Treatment! (aliás, gosto muito do In Treatment, principalmente da primeira temporada).
Tá, mas antes de falar outra palavra sobre qualquer outra série, preciso ser sincera com vocês. Eu tô apaixonada. Claro, pelo maridão, como sempre. Mas minha nova fantasia sexual no campo dos sonhos não é exatamente nova. E nem é tanto no campo dos sonhos. (Preciso pisar em ovos aqui, pois desde que, na Copa do ano passado, eu disse que via futebol também pelas coxas dos jogadores, veio leitor me chamar de adúltera por eu ser infiel ao maridão em pensamento. Porque até em pensamento a gente tem que ser monogâmica!).
É assim: lá estava eu vendo alguma temporada mais recente do The Office (adoro o Office americano, e algum dia falo mais sobre a série), quando apareceu um vendendor que teria de competir com o Jim e o Dwight. Toda a mulherada da série ficou dando em cima do lindão. Ele só aparece em mais um episódio, sempre sub-aproveitado. E eu via e pensava: quem é esse deus grisalho? E sabem quem era? O Timothy Olyphant! Quem, vocês podem perguntar se forem desatent@s e tiverem algum impedimento pra reconhecer um homem bonito quando veem um. Quando vi o terror que é Apanhador dos Sonhos, eu nem sabia quem era ele (ele é um dos quatro amigos). Quando vi a bomba que é 60 Segundos, também não. E muito menos quando vi Pânico 2 (veja cena com o Tim). Mas aí em 2005 e 06 eu estava numa lista de emails falando com meus ex-colegas de escola (estudei numa escola americana em SP, a Chapel) pra gente ver onde seria a nossa reunião de vinte anos de formados (a gente é Class of 86). Tava todo mundo conversando sobre onde morava, com o que trabalhava, quase todos casados, com filhos, espalhados pelo mundo. E aí a Alexis, uma americana simpática, contou que era casada com um ator de cinema, que ela era uma stay-at-home mom muito feliz, e que tinham três filhos. Eu não tinha sido bem da turma da Alexis (que era mais ligada em moda e tal) na escola, mas toda a classe era bastante unida e todo mundo se dava bem, sem bullying nem nada. Lembro que no Yearbook (livro de final de ano, tipicamente americano) ela escreveu, na maior inocência e falta de ambição, que seus planos eram casar com alguém famoso e ter filhos. Pois bem, ela tá com o Timothy desde 1990 –- o mesmo tanto de tempo que eu tô com o maridão. Conheceram-se na Universidade da Califórnia. É bem raro um casal ficar junto vinte anos em Hollywood.
Infelizmente, Alexis e Tim não vieram pra reunião, que acabou sendo durante um feriado prolongado num hotel-fazenda chique no interior de São Paulo. (A segunda opção mais votada pelo grupo foi Las Vegas, pra vocês terem uma ideia de como eu sou a mais pobre da classe, disparado. Adorei rever o pessoal. E se a comemoração dos trinta anos for em Las Vegas, eu vou!)
Na época, 2006, Tim ainda não era famoso, se bem que ele já era o nome principal da série Deadwood, sobre o velho oeste (vi alguns episódios e até gostei, mas mal dá pra distinguir um homem do outro –- todos têm barba, bigode e chapéu). Ele já tinha feito um personagem gay (o que, num mundo preconceituoso, é visto como ousadia pra um ator), e esteve em alguns filmes bem mainstream (foi o vilão de Duro de Matar 4 e protagonizou Hitman - Assassino 47, que não é bom, mas não por culpa dele). Depois de vê-lo no The Office, fiz questão de saber por onde ele andava. Encontrei Crazies (Epidemia, um filme com um daqueles temas apocalípticos que eu gosto, mas não é grande coisa) e a série de TV Justified. Já estou na segunda temporada de Justified e continuo gostando pacas. A série se passa numa cidadezinha no sul dos EUA que faz as vilas caipiras de True Blood e Crepúsculo parecerem fascinantes metrópoles em comparação. Tim interpreta um agente federal nascido num desses fins de mundo. Como punição por ter atirado num criminoso, ele é mandado de volta ao seu lugar de origem. E lá ele atira em mais gente e todo mundo atira nele, e ele volta a se relacionar com a ex-mulher, o pai e o amigo de infância fora da lei. Bom, este é um resumo bem pobrinho, mas a série tem personagens bem construídos e o humor característico do Elmore Leonard (Irresistível Paixão, Jackie Brown). Mas todos os motivos pra se ver Justified atendem pelo nome de Timothy Olyphant.
Então, sei lá, vocês não acham que ter estudado junto com a mulher de um (quase) astro de cinema equivale a meio que conhecer esse astro? Fuçando um pouquinho só, logo descobri que não sou a única apaixonada pelo Tim. Ele tem uma legião de fãs que põem todo tipo de vídeo-homenagem no YouTube, o elegem the sexiest man alive, o apelidam de Olafantastic, e perguntam por que ele não atua em 95% da produção hollywoodiana. E eu pensei que só eu e a Alexis gostássemos do Tim... Humpf!
Bom, Amandinha, tô até com vergonha da minha não-resposta pro seu email, mas eu precisava falar do Tim. E não conheço maneiras melhores de relaxar e esvaziar a mente que ficar olhando pra esse ator hipnotizante. Eu me sinto como uma adolescente cheia de posters espalhados pelas paredes do quarto.

terça-feira, 26 de abril de 2011

EDUCAR É NÃO RECORRER À VIOLÊNCIA

Faz uns seis meses, por aí, publiquei um guest post de uma moça que apanhou dos pais (de classe média alta) durante toda sua infância e juventude. Algum tempo antes, na ocasião em que Lula defendeu o fim da palmada educativa como forma de educar os filhos, escrevi dois posts sobre o assunto. Não escondo minha posição: eu nunca apanhei dos meus pais e, se tivesse filhos, procuraria educá-los da mesma forma. Bater numa criança, que é menor que a gente, que depende da nossa proteção e definitivamente não precisa da nossa violência, pra mim é pura covardia.
Tenho bichinhos de estimação que eu amo de paixão, como se fossem filhos, desde 1985. E nunca, jamais, encostei a mão neles se não fosse pra dar amor e carinho. Muitas vezes eles agiram errado. Meu último cachorrinho, meu amado Hamlet, de vez em quando fazia xixi na nossa cama, e ele sabia que tinha feito algo errado, porque automaticamente se escondia (não porque batíamos nele, mas porque lhe dávamos bronca). E olha que dialogar com animais é bem mais difícil que dialogar com uma criança, que pelo menos fala a nossa língua.
Aproveitando a comparação com animais (que é melhor que comparar filho com ladrões e estupradores, como foi feito nos comentários do guest post), o argumento do Leo, de que a gente nunca sabe como vai reagir à pirraça de um filho, é um ótimo argumento pra NÃO bater numa criança. Leo afirmou com outras palavras que adultos batem não pra educar, mas por causa de descontrole emocional. Ora, faça curso de controle de raiva antes de ter filho, pô. Porque essa explicação do “Nunca se sabe como vamos reagir” serve pra justificar quem espanca (e até mata) a mulher. Perdeu o controle, entende? Crime passional.
Como disse a Ághata, “O que você ensina através da violência é a) noção de hierarquia, b) respeitar a lei do mais forte (manda quem pode, obedece quem tem juízo) e c) a violência não apenas é aceitável como faz parte das relações humanas (pode até ser um gesto de amor, oras!). Os argumentos a favor do uso da força são um tanto quanto emocionais, olha só: 'Se você tivesse filhos, entenderia...'/ 'Eu trabalho o dia inteiro...'/ 'Sempre apanhei dos pais e sou absolutamente normal' (Se você diz, eu acredito, ó.)/ 'Eu bato pro policial não bater depois!!'(Adoooro essa!)/ 'Se o meu filho fosse que nem o seu, um anjinho, eu não bateria! Acontece que ele não é...' (Por que será?)”.
Gostei também da provocação: se bater é tão bom pra corrigir crianças, por que não permitir que professor@s, e mesmo estranh@s na rua, batam também nos seus filhos? Ah sei, é porque essas pessoas não os amam. Mas você, que bate no filho de cinta, realmente o ama . E essa é a melhor maneira que você tem de demonstrar isso. Ué, quase todo pai que bate no filho o ama. Duvido muito que haja tantos sádicos que sintam prazer em bater. Os pais do guest post sem dúvida amavam a filha que traumatizaram com tanta violência. Apesar de amá-la, eles a jogavam no chão e a puxavam pelos cabelos. Os pais que sem querer mataram a filha na porrada não queriam matá-la, apenas educá-la. Então assuma que a palavrinha chave pra desvendar esse enigma ― por que não deixar que todos sentem a mão no seu filho? ― é essa, seu. É o sentimento de posse, de achar que o filho só pertence a você e a mais ninguém, e é a única coisa que você realmente tem no mundo. Logo, você pode fazer o que quiser com ele, e ninguém deve se meter. É sua propriedade, afinal. Sinceramente, acho esse tipo de pensamento assustador.
Atena também provocou: “Pelo que observo na minha família, geralmente os avós não batem nos netos (mesmo os que bateram nos filhos no passado) e têm uma paciência muito maior com estes. Que será que eles aprenderam nestes anos todos que os fizeram mudar de tática?” Ou será que é o sentimento de posse (pais certamente sentem-se mais donos de seus filhos que os avós), o poder absoluto, que corrompe absolutamente e incentiva a violência?
Concordo com o que muita gente disse: não bater numa criança não tem nada a ver com não punir. Sabe, achar que quem não bate não estabelece limites é meio que dizer que quem não acredita em deus não tem valores. Nada a ver. Pros pais que não veem alternativas pra violência, só posso dizer que tenho pena de vocês. E muito, muito mais pena dos seus filhos. E digo mais: se vocês baterem nos seus filhos e eu vir ou ouvir, eu denuncio. Vocês não têm direito de ser covardes com uma criança só porque ela é sua. O que vocês achariam de alguém que bate todo dia no cachorro que vive com ele? Pode, só porque é dele? É pra educá-lo?
As Supernannies de todos os países em que o programa é feito e exibido são um ótimo exemplo de que bater não educa. Todas as super babás repetem esse mantra, e ensinam a ter autoridade com os filhos sem precisar recorrer à violência. Esses programas são feitos por pedagog@s e psicólog@s. E tod@s são unânimes em dizer que bater em criança só faz mal. Mas, claro, os pais acreditam que sabem mais do que eles. E baseado em quê? Na educação retrógrada que tiveram. Revejam seus valores, pessoas. Só porque seus pais bateram em você não significa que eles estavam certos.
Quem pensa que bater é a única (ou a melhor) forma de educar não deveria ter filhos. Simples assim.